Um cineasta marcado pelo diálogo social

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A partir de um cinema moldado pela simplicidade e a capacidade de refletir o mundo em que vivemos, Eduardo Coutinho criou um estilo em que a figura mais excluída e anônima tem sua importância e é ouvida independentemente de sua condição de sobrevivência

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Na manhã de 2 de fevereiro de 2014, morreu em seu apartamento, na Lagoa, zona sul do Rio de Janeiro, aos 80 anos de idade, Eduardo Coutinho. Seu filho, Daniel Coutinho, de 41 anos, esfaqueou o pai, tentou matar a mãe, Maria Oliveira Coutinho de 62 anos, que também foi ferida, e tentou suicídio com duas facadas em seu próprio abdômen.

Daniel morava com os pais e foi preso em flagrante delito. Ele foi indiciado por homicídio doloso, confessou os crimes para a polícia e um juiz decidirá quais medidas serão tomadas. Daniel declarou que dormia com uma faca desde alguns dias antes do delito.

O filho de Eduardo Coutinho sofre de síndrome do pânico. Segundo sua mãe, Eduardo e Daniel chegaram a fazer um acordo em que o pai se comprometia a não tentar interná-lo, caso ele deixasse de ser agressivo no ambiente doméstico.

Eduardo de Oliveira Coutinho nasceu em 11 de maio de 1933, em São Paulo. Ele teve uma formação acadêmica que passou pelo teatro, direito, jornalismo, e, sobretudo, no cinema. Em seus filmes, soube como ninguém reunir dois pilares: as técnicas de entrevista e os esquecidos pela sociedade. Utilizou o cinema como instrumento de análise, descrição e interpretação de fenômenos políticos e sociais. Coutinho abordou e contextualizou as dificuldades de pessoas marginalizadas. Para o cineasta, o desconhecido era o relevante, ele deu voz a essas pessoas. Personagens foram naturalmente criados, o cinema dele inverteu pelo menos em seus filmes, na condição de esquecidos eles passaram a ser ouvidos.

A perda de um talento como de Coutinho deixa uma lacuna irreparável na cultura nacional. Ele é um dos principais documentaristas brasileiros. Mas o intuito dessa matéria é fazer o caminho inverso. Mostrar algumas de suas obras, na forma que o homem cineasta-criador plantou várias sementes e colheu inúmeros frutos durante sua trajetória de vida.

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Na noite de 2 de março de 2014, em Los Angeles, nos EUA, ele foi homenageado na cerimônia do Oscar – nessa que é considerada por muitos a mais importante premiação de cinema do mundo. Na tradicional homenagem In Memoriam, em um telão com os nomes do cinema que morreram desde a cerimônia anterior, incluiu-se o brasileiro Eduardo Coutinho (1933-2014). No videoclipe, vimos a imagem dele, com a descrição: Eduardo Coutinho Documentarian: Twenty Years Later (Documentarista: Cabra Marcado Para Morrer).

Apesar de possuir vários títulos disponíveis para venda no mercado de filmes, Coutinho foi um autor que não colocava restrições para o acesso em suas obras. No YouTube, é possível assistir gratuitamente a seus filmes. Inclusive, vídeos postados antes de sua morte. Em 2 de fevereiro completa um ano que o cineasta nos deixou.

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Nos históricos e conturbados idos de 1968, no Brasil e no mundo, uma obra corajosamente inteligente utiliza o humor para contextualizar o momento histórico dessa época: O Homem que Comprou o Mundo (1968).

No País Reserva 17, um casal passeia e o rapaz deixa a noiva Rosinha (Marília Pera) em casa. Ele se oferece para entrar na casa dela, mas ela diz que só pode depois de casados. Quando vai embora, o noivo vê um homem indiano ser morto na rua, tenta ajudá-lo e, como recompensa, torna-se trilionário.

Aos cinco minutos de filme, Coutinho mostra um cheque em close com o brasileiríssimo nome de José Guerra (Flávio Migliaccio), ao som da canção que dá nome para o filme, interpretada por Maria Bethânia: “Assim vai o mundo e não vai muito bem. Alguém deve comprar, mas é preciso alguém vender. Se você quiser pagar, ele tem que receber. Dinheiro é sensacional.”

Quando José Guerra vai receber o cheque, é preso, pois o banco descobre que ele iria sacar a maior fortuna do mundo. Segundo o professor Bagdá (Abel Pera), o valor equivalente a 10 trilhões de dólares, dinheiro suficiente para destruir todo o sistema monetário internacional.

O humor irônico está presente no longa-metragem do início ao fim. Por exemplo, quando as autoridades do País Reserva 17 comunicam que, por razões de Estado e proteção aos direitos sagrados do indivíduo, decidem confinar José antes dele tomar posse da fortuna. Outro momento engraçado é vermos o renomado professor Bagdá afirmar que escreveu uma monografia, mas nesse país ninguém lê o que ele escreve.

Em plena ditadura militar imposta no Brasil, Coutinho tem a coragem de mostrar exercícios físicos e movimentos de soldados militares como uns abobados. Por meio da nossa grande arte, o futebol, os oficiais são ludibriados por agentes espiões para invadirem o local onde José está preso.

O filme O Homem que Comprou o Mundo traz um elenco de ótimos atores, como Flavio Migliaccio, no papel do ingênuo e humilde funcionário público, Raul Cortez como o ambicioso primeiro-ministro, Hugo Carnava na pele do hilário Cabo Jorge, entre outros.

O primeiro longa-metragem do diretor também satiriza outros filmes de espionagem, guerra fria, criação de clichês sobre personalidades e celebridades.

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No início da película Cabra Marcado Para Morrer (1964-84), vemos a imagem de um projetor de filmes demonstrando o amor do cineasta à sétima arte. Restaurado pela Cinemateca Brasileira em 2012, é o divisor de águas na carreira de Eduardo Coutinho, assim como para a história do cinema documentário.

Em abril de 1962, imagens foram filmadas durante a UNE Volante, uma caravana da União Nacional dos Estudantes que percorreu o país para promover a discussão da reforma universitária. Junto aos estudantes viajaram membros do Centro Popular de Cultura (CPC) da UNE, que pretendiam estimular a formação de outros centros de cultura nos Estados.

Como integrante do CPC, Coutinho filmou em Alagoas um campo de petróleo que a Petrobrás começava a explorar. Depois de passar por Pernambuco, a UNE Volante chegou à Paraíba em 14 de abril.

João Pedro Teixeira, 44 anos, fundador e líder da Liga Camponesa de Sapé (PB), foi brutalmente assassinado em uma emboscada. No dia seguinte à chegada da equipe de filmagem de Coutinho, na cidade de Sapé, realizou-se um comício de protesto contra o assassinato. O encontro popular foi filmado, contou com a presença da família de João Pedro e de trabalhadores camponeses.

O documentário situa o espectador por meio do recurso da narração em off, ou seja, quando o texto é narrado por um locutor. As narrações são alternadas entre Coutinho, Tite de Lemos e o poeta Ferreira Gullar. Como, por exemplo: “a sindicalização rural era um direito inexistente na prática, os trabalhadores do campo encontraram nas ligas o único meio legal para canalizar suas reivindicações. Aumento do foro, trabalho obrigatório e sem pagamento, despejo sem indenização pelas benfeitorias de lavouras, o uso da violência pelos grandes proprietários de terra. Na luta contra tudo isso, João Pedro forjou a unidade dos camponeses da região.”

Coutinho teve a sensibilidade de perceber a força de um fato histórico que havia filmado nas mãos. Trata o espectador como personagem participativo aos acontecimentos do filme, na forma de descrever as dificuldades na prática de se fazer cinema no Brasil. Explica como o planejamento do roteiro passou por mudanças forçadas pelas próprias realidades dos locais do Nordeste brasileiro, onde o filme foi rodado. Ocorreram tensos conflitos entre camponeses, Polícia Militar e Exército. Inclusive, o golpe militar interrompeu as filmagens do documentário, também alguns membros da equipe de produção foram presos pelo Exército. A maioria conseguiu fugir para o Rio de Janeiro.

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Cena de Cabra Marcado para Morrer

Com a abertura política no fim do período da ditadura militar, o cineasta termina as filmagens do longa-metragem. “Em fevereiro de 1981, 17 anos, depois voltei para completar o filme do modo que fosse possível. Não havia um roteiro prévio, mas apenas a ideia de tentar reencontrar os camponeses que tinham trabalhado em Cabra Marcado para Morrer. Queria retomar o nosso contato através de depoimentos sobre o passado. Incluindo os fatos ligados à experiência da filmagem interrompida, a história real da vida de João Pedro, a luta de Sapé e também a trajetória de cada um dos participantes do filme daquela época até hoje.”

O cinema pode unir e transformar uma comunidade na prática e dentro do seu mundo. Em uma noite de sábado, Coutinho projeta o material salvo, filmado na década de 1960, para os trabalhadores rurais. Eles são os próprios atores do filme. Muitos deles vieram de longe para assistir a projeção.

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A película registra os depoimentos de vários personagens que participaram do filme, conta as mudanças de vida, entre 1960 a 1981. Cícero Anastácio da Silva, um dos entrevistados que o diretor foi até o Sudeste para ouvi-lo, endossa a fé e a expectativa do trabalhador em acreditar na arte. Cícero declara que os elementos fundamentais para a conclusão do longa-metragem foram a paciência e a persistência que resistiram ao tempo. Quando perguntado se ele tinha esperança, que a equipe de filmagem voltaria para completar o filme, ele diz: “Sempre tive essa esperança, sempre pensava nisso. Minha mãe era viva na época e dizia que esse tempo não chegaria mais não. Eu dizia, ‘chega mãe só não vê aquele que morrer, mas aquele que não morrer vê.’”

Cabra Marcado Para Morrer possui uma linguagem fílmica simples, funcional e eficaz. O diretor utiliza recortes de jornais sensacionalistas da época, com fotos fortes e chocantes. Faz excelente uso do som nos efeitos sonoros, por vezes perturbadores e que chamam a atenção nos momentos tensos. Um dos pontos fortes do filme é a montagem primorosa, que soube valorizar 40% do material original filmado durante o roteiro.

Elizabeth Teixeira, esposa de João Pedro, tinha 37 anos e 11 filhos quando ele foi assassinado. Vinte dias depois do assassinato de João, Elizabeth viajou para o Sul do país. Em 5 de maio de 1962, em Brasília, ela depôs na Comissão Parlamentar de Inquérito sobre a situação de trabalho no campo. Deputados membros da CPI a indicaram para assumir o lugar de João Pedro, para o sustento de seus filhos e, com isso, a Liga Camponesa engrandeceria com a sua presença. Como uma mulher forte e idealista, a viúva afirma: “Assumo, mesmo que tenha que perder a minha vida, que corra risco de morte, substituo e trabalho autêntica. Na minha luta, protesto contra o assassinato de João Pedro e como todos os companheiros que tombaram.”

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Cena de Cabra Marcado para Morrer

Elizabeth sofreu fortes repressões políticas e ficou presa durante quatro meses. Ela foi solta pela justiça, mas as perseguições continuaram. Temendo ser exterminada como seu marido, a viúva precisou fugir. Ela ficou desaparecida durante 17 anos, sua família e seus antigos companheiros da Liga de Sapé não sabiam onde ela se refugiara. Abraão Teixeira, seu filho mais velho, era o único que sabia.

Ativa aos 56 anos, Elizabeth lavou roupa e louça para fora, estudou até o segundo primário e deu aulas particulares para crianças carentes. Com uma postura firme, nos deixou a seguinte mensagem, no ano de 1981: “É preciso lutar e mudar o regime. Enquanto existir essa democracia sem liberdade, com salário de miséria e fome, a luta não pode parar.”

O cinema social de Coutinho levou notícias da mãe Elizabeth para a sua família. Por meio da sétima arte, ele fez a emocionante ponte de reencontro entre os vários irmãos vivos e espalhados geograficamente pelas duras mudanças forçadas em suas vidas. Visitou diversas cidades do Nordeste e Sudeste. E para orgulho da família de camponeses, também foi localizado Isaac Teixeira, que cursava o 5° ano de medicina em Cuba.

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Muitas vezes, as sequências das imagens falam por si só. Violentas, chocantes e reais. A câmera na mão percorre um lixão, em meio a urubus que voam baixo em volta de detritos, seringas usadas, comida em processo de decomposição, um estado de miséria absoluta. Trata-se de um depósito de lixo a céu aberto, conhecido como vazadouro, localizado em São Gonçalo, município do Rio de Janeiro. O Brasil é a sétima economia do mundo, mas tem muito o que fazer para acabar com a miséria e a distribuição de renda em nosso país.

Boca de Lixo (1992) contextualiza diversas questões, sobretudo quem são os cidadãos que vivem do lixo, que reaproveitam o resto da sobra do que é descartado pela população.

Por meio de uma grande reportagem, revela ao espectador como é o rosto dessas pessoas, quais sãos os motivos de estar naquele ambiente, o que elas têm a dizer, o que pensam, e como é a vida delas.

Uma das marcas registradas de Coutinho é a habilidade de um bom jornalista em conseguir conversar de igual para igual com o mais humilde. Por meio de uma abordagem simples, mas estrategicamente bem planejada (olho no olho) para aproveitar os diálogos, faz as entrevistas sem máscara no vazadouro e consegue contundentes depoimentos.

Assim como nos documentários Cabra Marcado Para Morrer, Boca de Lixo e outros, o cineasta intercala as sequências de entrevistas entre os seus personagens

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Cícera – Cena de Boca de Lixo

Cícera, que não tem vergonha de ser mostrada nas câmeras trabalhando no lixo, afirma: “A gente tem que se virar aqui mesmo, a gente não está matando nem roubando. Estamos trabalhando. A gente trabalha para vender. Deus me dá saúde é para trabalhar. Já trabalhei muito em casa de madame, não gosto de ser mandada, gosto de mandar em mim. É isso aí, até um dia melhorar.”

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Um jovem do local questiona a filmagem: “Que é que vocês ganham com isso? Pra ficar botando esse negócio na nossa cara?” E a resposta direta de Coutinho: “É para mostrar a vida real de vocês, para as pessoas verem como é.”

Além das imagens, canções populares também contribuem na contextualização do documentário, como Sonho por Sonho, interpretada por José Augusto. A escolha dos caracteres dos nomes do filme e dos personagens com fundo em tom pastel e escrito à mão harmonizam com o visual decadente do lixo.

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Jurema – Cena de Boca de Lixo

Impensável para a maioria das pessoas, o diretor encontrou um casal (Jurema e Antonio) que se conheceu no lixão. Eles constituíram família, convivem há 12 anos e continuam juntos.

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Em Peões (2004), o longa-metragem registra como está atualmente a vida de ex-metalúrgicos (homens e mulheres) que participaram de grandes greves e fizeram parte do progresso de nosso país, nas linhas de montagem de montadoras, no Estado de São Paulo.

Por meio de GC (gerador de caracteres), Coutinho traça uma linha no tempo da história brasileira: “1959 – Nasce a indústria automobilística no Brasil. Empresas multinacionais se instalam na região do ABC, Grande São Paulo. 1964 – Golpe instala uma ditadura que vai durar 21 anos. Os sindicatos sofrem intervenção e o direito de greve é praticamente abolido. 1979 – Metalúrgicos do ABC deflagram greve geral. É o primeiro movimento de massas da classe operária depois de 1964. Luiz Inácio da Silva, o Lula, lidera cerca de 140 mil grevistas.”

O documentarista também utiliza o cinema para fazer cinema. Aos 11 minutos de filme, são exibidas imagens dessa greve com o Lula sendo carregado nos braços por metalúrgicos e discursando para aquela massa. Esse é um trecho de ABC da Greve (1979-1990), e o cineasta também incorpora outras produções do gênero no decorrer de Peões. Greve (1979) e Linha de Montagem (1982). Usar esses documentários é um sinal de respeito e homenagem a esses filmes, que são referências na cinematografia nacional. Também é uma atitude demonstrada que não se faz cinema sozinho.

Nos trechos selecionados pelo diretor em momentos épicos e emocionantes na figura de Lula, a sua liderança é destacada. Há uma tomada de posição política por meio da arte, pois é clara a mensagem do documentário. Depois de ouvirmos a trajetória comovente dos peões, um metalúrgico citado durante o filme é eternizado em um texto curto, porém determinante. “No dia 27 de outubro de 2002, Luiz Inácio da Silva foi eleito presidente da República no segundo turno com mais de 52 milhões de votos.”

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Globo Repórter

Eduardo Coutinho integrou-se à equipe do Globo Repórter no ano de 1975, onde ficou durante nove anos e, segundo o próprio cineasta, foi uma grande escola que o fez optar pela carreira de documentarista. Mesmo com a censura, tinha controle sobre todo o processo e trabalhava com relativa liberdade.

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Apresentado nos caracteres iniciais como Major Theodorico Bezerra (1903-1994), à primeira vista pronuncia-se como um homem simples da agricultura e do campo.

Na sua gigantesca Fazenda Irapurú, de 14 mil hectares, no estado do Rio Grande no Norte, o Major fala para uma equipe de reportagem da TV Globo e de Eduardo Coutinho, pensando que esse seria um programa feito para agradá-lo.

O episódio Globo Repórter que foi ao ar em 22 de agosto de 1978, com o titulo de Theodorico, Imperador do Sertão representa exatamente a dimensão do político e fazendeiro, em suas terras. Para um agricultor trabalhar em sua fazenda, é obrigado seguir a risca, uma cartilha com regras e mandamentos.

Todos os moradores tem na sala um quadro na parede de vidro com moldura, as condições para ele viver na propriedade. É proibido aos habitantes dessa propriedade:

1-Andar armado seja qual for o tipo de arma; 2-tomar aguardente ou qualquer bebida alcoólica; 3-jogos de azar; 4-Fazer feira em outra localidade, que não seja Irapurú; 5-Caçar; 6-Brigar com seus vizinhos; 7-Fazer quarto para doentes; 8-Fazer baile sem o cosentimento do proprietário; 9-Criar seus filhos sem aprender a ler e escrever; 10-Falar mal da vida alheia; 11-Inventar doença para não trabalhar. O morador que não cumprir fielmente esse regulamento terá o prazo de 24 horas desocupar a casa e ir embora.

Quando Coutinho pergunta se os agricultores cumprem tais condições, ele diz que se não cumprirem são expulsos do local. O diretor faz a mesma pergunta para os trabalhadores, o Imperador interrompe e responde por eles. “Já sabem que é assim.” Só depois permite eles falarem, induzindo completamente suas respostas. O Major, ainda leva o advogado da fazenda, nas entrevistas. Theodorico tem uma retórica intimidadora ao conversar com seus subordinados, sempre pergunta: “Por que você não vai embora daqui?”

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Cena de Theodorico, Imperador do Sertão

Político desde 1947, em cargos legislativos faz discurso aos domingos em sua fazenda. Utiliza alta promoção de marketing do “bonzinho”. Onde tudo é dado e tudo é de graça. “Tudo que eu fiz aqui foi para lhe servir.”

Theodorico obriga os trabalhadores a votarem nele pela força do poder. Organiza nas suas terras o alistamento eleitoral dos moradores. Tem a audácia de dizer para as pessoas que trabalham ali, que dão o suor e dedicação. “A única coisa que vou precisar de você é o seu voto, fora isso, outra coisa não vou precisar. Você não tem um automóvel para me emprestar, não tem dinheiro para emprestar, mas o voto você tem. Se esse voto você não me der, para que eu vou conversar com você e eu perder tempo? Eu não perco tempo. Por isso, estou lhe avisando.”

O Imperador é tão poderoso que tem o apoio da prefeitura, governo do estado poder judiciário e a imprensa local. Revela-se um homem de caráter duvidoso, quando afirma. “Na política nós ajudamos aqueles que nos ajudam, isso é uma coisa muito natural. A política é feita com fogos e dança. Não se faz política com choro, não.” Também posiciona-se contra o Fundo Rural de Aposentadoria (Funrural), que garantem direitos trabalhistas.

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Outros títulos do diretor

Santo Forte, 1999, entre uma missa campal celebrada pelo papa no Aterro do Flamengo e, meses depois, a comemoração do Natal, o documentário penetra na intimidade dos católicos, umbandistas e evangélicos de uma favela carioca.

Babilônia 2000, idem, na manhã do último dia de 1999, uma equipe de filmagens sobe o Morro da Babilônia, no Rio de Janeiro. Lá existem duas favelas, Chapéu Mangueira e Babilônia, situadas na orla de Copacabana. As câmeras acompanham os preparativos locais para o Réveillon, ouve os moradores locais a fim de saber as expectativas deles para o ano 2000 e para que possam fazer um balanço de suas vidas.

Edifício Master, 2002, mostra o cotidiano dos moradores do prédio situado em Copacabana, a um quarteirão da praia. O prédio tem 12 andares e 23 apartamentos por andar. Ao todo, são 276 conjugados, onde moram cerca de 500 pessoas. Eduardo Coutinho e sua equipe entrevistaram 37 moradores e conseguiram extrair histórias íntimas e reveladoras de suas vidas.

O Fim e o Princípio, 2005, sem pesquisa prévia, sem personagens, locações, nem temas definidos, uma equipe de cinema chega ao sertão da Paraíba em busca de pessoas que tenham histórias para contar. No município de São João do Rio do Peixe, a equipe descobre o Sítio Araçás, uma comunidade rural onde vivem 86 famílias. Graças à mediação de uma jovem de Araçás, os moradores contam suas vidas, marcados pelo catolicismo popular, pelo senso de família e de honra.

Jogo de Cena, 2007, atendendo a um anúncio de jornal, 83 mulheres contaram sua história de vida em um estúdio. Vinte e três delas foram selecionadas, em junho de 2006, e filmadas no Teatro Glauce Rocha. Em setembro do mesmo ano, várias atrizes interpretaram, a seu modo, as histórias contadas por essas mulheres.

Moscou, 2009, em Belo Horizonte, o Grupo Galpão e o diretor de teatro Enrique Diaz se dispuseram a enfrentar o desafio de montar, em três semanas, a peça As Três Irmãs, de Anton Tchekhov. O filme é composto de fragmentos dos workshops, improvisações e ensaios de uma peça que não teve e nem terá estreia.

As Canções, 2001, documentário sobre a experiência de pessoas comuns e canções da música popular.

Saiba +

O Homem que Comprou o Mundo, disponível em
https://www.youtube.com/watch?v=OR56IUuGcnQ

Cabra Marcado Para Morrer, disponível em
http://www.youtube.com/watch?v=JE3T_R-eQhM

Boca de Lixo, disponível em
http://www.youtube.com/watch?v=oZcTlC757mM

Peões, disponível em
http://www.youtube.com/watch?v=JEde0T13kF8

Theodorico, Imperador do Sertão, disponível em
http://www.youtube.com/watch?v=e9O0jn84Asw

 

Reportagem publicada no site Almanaque Virtual:
http://almanaquevirtual.com.br/eduardo-coutinho-um-cineasta-marcado-pelo-dialogo-social
Reportagem publicada no Blog 2001 Vídeo Locadora:
http://www.2001indica.com.br/eduardo-coutinho-um-cineasta-marcado-pelo-dialogo-social/